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          Era o meu gêmeo. 
    
          Tínhamos a mesma idade, a mesma cara, os mesmos pensamentos.
          Quando passávamos pela mesma rua,
          A gente dizia que tínhamos os mesmos sapatos,
      5  Quando tomávamos o mesmo comboio
          Os passageiros diziam que éramos a mesma pessoa.
    
          Mas não críamos no mesmo Deus.
          O meu gêmeo cria num deus indiano
          Enquanto eu cria num deus cristão que não era Cristo nem era Deus.
    10  Escrevíamos os mesmos poemas,
          Frios, sem alma, sem força e talvez sem palavras
    
          E as mesmas imagens
          Voavam sobre os nossos olhos, que tinham o mesmo incolor.
          A manhã, no mesmo eléctrico, falávamos no mesmo jugador de fútebol,
    15  E a tarde, no mesmo bar, falávamos na mesma mulher,
          Uma cantante o uma actriz.
    
          Mas não tínhamos as mesmas ideias.
          O meu gêmeo cria na obediência, enquanto eu cria na liberdade,
          Que não é pão mas pode ser água ou vinho.
    20  Quem era o meu gêmeo, 
          Nunca consegui saber.
    
          Soube, um dia, que falecera
          O mesmo dia em que eu morrei de uma doença desconhecida;
          Assim ele, que cria no deus indiano, reencarnou-se numa flor de montanha,
    25  Num elefante, no presidente dos Estados Unidos e no hidróxido de carbónio,
          Na primeira página do Asahi Shimbun e numa ruga de Emma Goldman
    
          Enquanto eu, que cria no deus cristão,
          Ressurgi depois de três dias,
          Fundei uma nova igreja e tornei-me papa, e agora estou em Roma
    30  No trono papal, com esta cara papal, estas palavras papais e a minha
          Papalíssima inutilidade.
    
    
    
          Era il mio gemello. 
    
          Avevamo la stessa età, la stessa faccia, gli stessi pensieri.
          Quando passavamo per la stessa strada,
          La gente diceva che avevamo le stesse scarpe,
      5  Quando prendevamo lo stesso treno
          I passeggeri dicevano che eravamo la stessa persona.
    
          Ma non credevamo nello stesso Dio.
          Il mio gemello credeva in un dio indiano
          Mentre io credevo in un dio cristiano che non era Cristo e nemmeno Dio.
    10  Scrivevamo le stesse poesie,
          Fredde, senz'anima, senza forza e forse senza parole
    
          E le stesse immagini
          Volavamo sopra i nostri occhi, che avevano lo stesso incolore.
          Al mattino, sullo stesso tram, parlavamo dello stesso giocatore di calcio,
    15  E la sera, nello stesso bar, parlavamo della stessa donna,
          Una cantante o un'attrice.
    
          Ma non avevamo le stesse idee.
          Il mio gemello credeva nell'obbedienza, mentre io credevo nella libertà,
          Che non è pane ma può essere acqua o vino.
    20  Chi fosse il mio gemello,
          Non sono mai riuscito a saperlo.
    
          Seppi, un giorno, che era morto
          Lo stesso giorno in cui io sono morto di una malattia sconosciuta;
          Così lui, che credeva nel dio indiano, si reincarnò in un fiore di montagna,
    25  In un elefante, nel presidente degli Stati Uniti e nell'idrossido di carbonio,
          Nella prima pagina dello Asahi Shimbun e in una ruga di Emma Goldman
    
          Mentre io, che credevo nel dio cristiano,
          Risorsi dopo tre giorni,
          Fondai una nuova chiesa e divenni papa, e ora sto a Roma
    30  Sul trono papale, con questa faccia papale, queste paroli papali e la mia
          Papalissima inutilità.
    
    
    ["cosa" (o "bischerata" che dir si voglia) tratta da Poemas em português, 1993-1994]